segunda-feira, 5 de novembro de 2018

[Sessão Crítica] O Doutrinador


UM SOLDADO EM GUERRA
Personagem fictício e autêntico colocado num ambiente real e histórico é ponto de partida para fazer o espectador embarcar e se envolver no conto.

Em tempos de eleição, decorrente do enferrujamento da corrupção, o povo elege uma grande parcela da extrema oposição – junto ao presidente, que simbolizou todo esse processo (para o bem ou para o mal, só vamos saber o que virá à seguir no ano que vem). Momentos históricos (e até mesmo prato cheio para quem estuda pra concurso público) surgiram no país como há muito tempo não se via. A história se repete.

O Doutrinador se comunica muito bem com esse período moderno da corrupção com extrema sinceridade, com diálogos fortes e edição primorosa (combinada ao jogo de cores incríveis que ilustram as noites da cidade), a ambição desta adaptação cinematográfica de uma série em quadrinhos nacionais criada por Luciano Cunha é perceptível desde o começo – principalmente por nos trazer um super-herói que não usa símbolo ou capa, um guerreiro que surge por acidente (e não são tantos assim hoje em dia desde o surgimento de Batman ? ). Porém, toda essa origem de raíz não foge da realidade brasileira e não cai no pieguismo.  

Outra característica que vale citar é que O Doutrinador é cria da visão anti-heróica pós Batman que estava surgindo – melhor enraizada nos anos 80, com O Corvo, AsTartarugas Ninjas e até mesmo O Máskara. O Doutrinador é O Justiceiro da MARVEL nas atitudes; e um Cavaleiro das Trevas de Frank Miller na estética. 

A forma de agir, voraz e visceral, cria o tom profundamente pesado e nos traz de forma seca, como um supersoco destruidor no estomago, aquilo que sempre esperaríamos de alguém – ou de nós mesmos – punir aqueles que nos fazem mal ou então o próprio sistema. Quantas vezes não ouvimos por aí, ou muitos de nós falamos, sobre “ – Vou jogar uma bomba em Brasília e matar todos os políticos ! “ enfim, há uma conscientização humana sobre isso em meio ao seco conflito sem nenhuma censura (os bem vindos 16 anos de classificação são muito bem aproveitados sobre isso) - nunca o teor de violência trash foi tão bem aproveitado no cinema Brasileiro – para apresentar em detalhes o que todo mundo tem medo de mostrar na tela. Ou melhor do que isso, conseguem melhorar esse estilo. O Doutrinador – mesmo que acidentalmente – homenageia esse gênero como se fosse comparado a uma “porchanchada de luxo”. Uma celebração aos filmes B com cara de classe A.  E a agitada trilha sonora, muito bem encaixada e coerente, combina perfeitamente com todo o tom pesado da narrativa diante dessa guerra organizada por um herói rebelde.

A exploração humanizada dos antagonistas da trama acaba criando esse tipo de envolvimento emocional como o espectador, não mostrando (nem sempre) muito além do que palavras a respeito de envolvimentos com a corrupção – exatamente o que vimos na TV, nos ajudando a entrar no tom da fantasia com os pés na realidade.

Ainda que situações pareçam corridas ou pouco aprofundadas em determinados detalhes, muito da sua conclusão valerá à pena diante do que foi apresentado ou apenas interpretado pelo espectador. O único ponto negativo, talvez, seja a utilização de efeitos em computação gráfica (em raro momento) sem explorar efeitos práticos nessa situação, o que manteria a essência realista do longa.

Vale citar também o bem escalado elenco. Kiko Pissolato, como Miguel, a identidade secreta do herói, é sóbrio e tem porte para representar e se destacar na tela, mantendo a atenção do espectador a todo momento. As intervenções dos coadjuvantes (ou os ditos “ heróis secundários” ) cria um aspecto de torcida e irritação dos espectadores no meio do seu trajeto enquanto vale pensar que realmente ninguém se importa com o que você pensa no seu dia a dia enquanto se transforma numa bomba relógio diante de toda a catástrofe e tragédia pessoal.

Nina (Tainá Medina, colírio da trama que desenvolve ótima transformação com sua personagem) e Edu (Samuel de Assis) estão entre os que constroem essa consciência de proteção ao lado moral. Porém, a situação acaba se repetindo um pouco quando outros personagens também se opõem às atitudes, como Nina (Natália Lage), mas vale para criar um momento de diálogo na mente inabalável do protagonista - buscando um contraste de sua determinação com o lado familiar ( este tema que tem um espaço de aproveitamento bem favorável, por sinal, a fim de também mostrar as origens do protagonista).

É certo que há uma resistência aos filmes de ação sobre cotidiano no cinema nacional. Quando surgiu Cidade de Deus, logo depois passaram a tratar o próximo longa do gênero como mais um favela movie – ignorando a alta qualidade dessas produções e com Tropa de Elite não foi diferente. Quando se trata da realidade nacional, e não um filme de comédia (o que mais tem no país), a mídia em especial constrói toda uma perseguição atrás.

O Doutrinador pode valer como uma terapia ao mesmo tempo que pode ser apreciado como uma das produções de ação mais bem feitas sobre drama político desde Tropa de Elite2.



E drama político é um gênero praticamente extinto no cinema hollywoodiano atual. O cinema Brasileiro se mostra corajoso ao valorizar esse tipo de produção. A ascensão do cultuado José Padilha com seu Capitão Nascimento trouxe ares de esperança para o surgimento mais do que bem vindo e necessária história desses poderosos quadrinhos nacionais para o cinema.

MEMÓRIAS DA SESSÃO
O lançamento do filme foi bem na semana da CAPCOM PRO TOUR: Latim América, evento que aceitei participar de última hora graças ao convite de um amigo. Como aproveitei pra assistir horas antes da viagem, foi uma bela contada de relógio com correria depois da sessão.

O público foi bem pacífico – eu ri de algumas situações, mas o público foi moderado. No fim, apenas eu e mais um espectador (guerreiro como eu) ficou até depois dos créditos – aturando as luzes ligadas (logo após as artes dos créditos). Tentei levantar aplausos junto a um outros espectador ao lado mas nada aconteceu. Um filme que, na minha sincera opinião, merecia uma salva de aplausos por mais e uma hora, diferente de longas de comédia bem idiotas e cheio de besteiras de graça, sem conteúdo ou base alguma (do gênero “-Vou Ser Podre pra Tentar ser Engraçado na Tela” do jeitinho brasileiro) que muitos puxam saco por aí.

Acredito que a maioria que não aplaudiu, certamente sentiu esse soco no estomago para pensar um pouquinho sobre a vida - ou não - já que Brasileiro tá difícil de levar jeito.  

SESSÃO CRÍTICA
O DOUTRINADOR
SESSÃO ACOMPANHADA: UCI PARKSHOPPING -  20:10 - I 09 – 02 / 11/ 2018
SLOGAN:  A CORRUPÇÃO ENCONTROU O SEU PIOR INIMIGO 
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